segunda-feira, 16 de novembro de 2009

O branco de esquerda racista é mais dissimulado do que o de direita

Lourenço Cardoso
(texto escrito em 2003 publicado In: http://www.apropucsp.org.br/jornal/jornal_343.htm)

O branco de esquerda adjetiva-se subversivo, revolucionário e acusa o branco de direita de conservador, reacionário. Esquerda e direita discordam na maioria dos itens, sobre relação “racial” (étnica) suas opiniões, análises e reflexões são semelhantes. Como se explica o consenso de opinião sobre ação afirmativa?
Como se explica o pacto entre esquerda e direita? A conformidade entre ex-ministro da educação Paulo Renato e do atual Cristóvão Buarque? Como se explica a avaliação semelhante do professor do ensino infantil ao universitário? Como se explica a unanimidade dos intelectuais? Unanimidade que apenas diz: sou contra e pouco propõe.
Edith Piza e Maria Aparecida da Silva Bento (2002) remete-nos a estas reflexões: O que é ser branco na sociedade brasileira? Qual papel que o branco ocupou ou ocupa numa situação de desigualdade racial no Brasil? (Cf. “Psicologia Social do Racismo: estudos sobre branquitude e branqueamento”). Quando se trata de questão “racial”, esquerda ou direita, rico ou pobre, carioca ou paulistano, corintiano ou palmeirense, universitário ou analfabeto, mulher ou homem, heterossexual ou homossexual deixam suas divergências de lado e tornam-se apenas brancos. Refiro-me excepcionalmente ao branco brasileiro.
No combate ao racismo tanto o branco de esquerda, quanto o de direita são conservadores. Talvez seja esta uma das razões da indignação e gritaria com a universidade que adota a política de ação afirmativa. Política que a mídia diminui: “a cota para negro”, e instiga a sociedade “ser contra ou a favor”. Como se explica o consenso da mídia? O branco ler jornal, revista, site, assiste tele-jornal, ouve rádio e critica. Questiona a seriedade, valores, ideologia e profundidade dos autores e veículos. Estranhamente sobre este assunto absorve as informações e ingenuamente repete a frase: “cotas sou a favor”, “cotas sou contra”. Como se explica esta leitura superficial?
"Mas o que estaria por trás das críticas às propostas de políticas voltadas para negros? Para a doutora em psicologia social pela Universidade de São Paulo (USP) Maria Aparecida da Silva Bento há uma espécie de luta silenciosa pela manutenção de privilégios. ‘Há um pacto não verbalizado entre os brancos a partir do momento da discussão das cotas como se os negros estivessem querendo mexer com um privilégio que sempre foi deles.(...) Maria Aparecida (...) é autora de uma tese sobre “branquitude e poder”. Ela diz que a idéia das cotas levou muitos brancos a passarem a pensar na sua "racialidade" e a defender os direitos do "branco pobre" e não apenas do pobre. E aí, segundo ela, se juntam tanto o branco dos sindicatos quanto o das empresas, o da direita e o da esquerda". (O Estado de São Paulo ‘Geral’ Domingo, 16 de fevereiro de 2003)
Maria Aparecida Bento ratificou o que havia apontado. Quando se trata de defender os privilégios que se tem no Brasil por ser branco, une-se o branco de esquerda e direita. A situação é mais complexa, a respeito de relação “racial” o branco inovador pode tomar atitude conservadora do mesmo modo o conservador agir de maneira inovadora. Como se explica José Sarney ser autor de um projeto de lei que visa combater o racismo? Como se explica Marcos Maciel escrever a favor de políticas compensatórias voltadas para negros? No artigo “A questão étnica no Brasil”, publicado na “Folha de São Paulo” em 18 de novembro de 2000, o ex-vice-presidente escreveu:
"Vencer o preconceito que se generalizou e tornar evidente o débito de sucessivas gerações de brasileiros para com a herança da escravidão que se transformou em discriminação são apenas parte do desafio. Se vamos consegui-lo com o sistema de quotas compulsórias no mercado de trabalho e na universidade, como nos Estados Unidos, ou se vamos estabelecê-las também em relação à política, como acaba de fazer a lei eleitoral, com referências às mulheres, é uma incógnita que de antemão ninguém ousará responder".
O branco de direita não se aproxima do “negro militante”, negro que combate o racismo, quanto ao branco de esquerda ele vem com um “sorriso largo”, sempre acontece o que disse o “velho militante”: (...) quando um branco dava um sorriso para o negro, o negro tinha que aceitar aquilo como favor (...) é um dos preconceitos mais safados que pode haver. (...E disse o velho militante José Correia Leite p.21). Sobre questão “racial” o branco de direita é menos hipócrita, “mais safado” esta é a característica que podemos distinguir o branco de esquerda e direita.
Se o branco de direita pedir seu voto não será redundante na promessa que combaterá a desigualdade “racial” por defender a “democracia racial” evitará o tema. O branco de esquerda além de alardear o combate ao racismo criará núcleos em seus partidos para tratar desta questão, não dará importância necessária porque reduz o problema de relação entre negro e branco a “luta de classe”.
O branco de esquerda, além dos votos, insiste para que o negro entre em seus partidos, entidades, ONGs, associações para submeter o negro as suas idéias e direção. Eldridge Cleaver teorizou que o branco, simbolicamente, considera: “O negro como corpo e o branco como cérebro: o corpo deve ser submetido ao cérebro” (Alma no exílio p. 52-53). O branco procura submeter o negro, aceita que o negro vá longe “torne-se ministro”, jamais assumir o poder principal.
Entre branco racista de direita ou esquerda mais ou menos hipócrita os dois são deploráveis, compete-nos combatê-los. Sobre a participação do negro em partidos políticos de esquerda ou direita sustento a opinião do Correia Leite (1992, p.210): "(...) Eu sou contra se dividir politicamente. Agora, as pessoas podem participar de partido político, mas não dizendo que com isso vão resolver o problema do negro, quando estão divididos em um partido branco".
A branca Edith Piza (e outros estudiosos negros e brancos) que estuda relação “racial” problematizando o branco, chama-nos atenção que a discriminação “racial” não é um “problema do negro” e sim “problema de relação ‘racial’”, o branco é igualmente responsável. Se o branco, independente de sua classe, não lutar contra os privilégios que possui na sociedade brasileira, simplesmente por ser branco. Ele não estará contribuindo para construção de uma sociedade humana.

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